Pesquisar este blog

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Povoamento, como tudo começou...



Povoamento nativo e povoamento colonial
O significado do povoamento é uma questão importante que surge para se compreender melhor a
sociedade piauiense do século XVIII para o XIX: a “conquista do território” foi uma verdadeira guerra
de extermínio provocando o despovoamento dos nativos, os habitantes dos sertões quando chegou o
preador, o colonizador, o criador que se arma “até os dentes” contra os nativos que na visão daqueles,
“perturbavam tranqüilidade dos colonos”. Ora, os nativos foram expropriados, vilipendiados,
escravizados, aldeados para que surgisse uma outra sociedade e entram para a história como selvagens
que faziam arruaças, ameaças, correrias, violências?
Nesse sentido, tenciona-se aqui reforçar a discussão sobre o significado de conceitos como “conquista”
“descobrimento” ou “invasão”, para mostrar que o povoamento colonial gerou um despovoamento nativo
e que, portanto, o processo de colonização desenrolou-se sob a égide da destruição de um povo.
O chamado “povoamento do Piauí” pelo colonizador branco representou também o despovoamento
de sua população nativa; com o final da guerra da colonização, o Piauí estava despovoado de nativos.
No lugar deles formou-se uma outra população, exógena, livre e escrava constituída por uma mistura
do nativo, do negro e do branco colonizador, os elementos étnicos predominantes na sociedade
brasileira: a estratificação nativa é substituída pela colonial escravista9.
A idéia de “conquista do território piauiense”, é intensamente usada pela historiografia reproduzindo
que o colonizador europeu inculcou durante séculos, servindo como justificativa à mortandade praticada
contra os nativos, para se apoderarem de suas riquezas e torná-los escravos. A concepção de ocupação
e povoamento perpassa por toda a historiografia brasileira, da mais tradicional a mais moderna, bem
como a idéia de descobrimento, aparecendo como acontecimentos naturais no universo de uma nova
ordem comandada por Portugal, um episódio da expansão ultramarina européia10.
A conquista aqui é vista como invasão das terras. Como tem sido dito atualmente por estudiosos, a
América foi invadida e não descoberta. Esta mesma interpretação pode ser perfeitamente relacionada
ao Piauí. Claro que para o europeu, que chegou aqui com o objetivo de se apossar de tudo, é um ato
de conquista, mas sob o ponto de vista dos nativos, foi uma invasão. A conquista foi sempre mostrada
como um direito do europeu por ter “descoberto” as novas terras. O termo “descobrir” é pleno de um
sentido de dominação que justificou a “conquista” por meio de um brutal sistema de colonização11.
A historiografia piauiense incorporou e reproduz tradicionalmente a idéia de “conquista do território”
descoberta, ocupação e povoamento para explicar a ocupação das terras dos nativos e em geral
focaliza a implantação das fazendas de gado, o comércio, a organização do poder a partir das
famílias latifundiárias, dando pouco destaque à existência de uma população dizimada pela guerra,
sem se dar conta de que esses conceitos valorizam unilateralmente a perspectiva do colonizador,
apagando e até mesmo menosprezando a existência de uma outra população no cenário onde se
desenrolou a história da colonização.
Essa visão foi introduzida pela documentação utilizada por uma geração de escritores-historiadores
que apenas reproduziram-na quase que literalmente, de alguma forma seguindo a tradição da
historiografia brasileira que também difunde a idéia unilateral de conquista do território pelo
colonizador, quase como um direito por ser mais poderoso e rico, impondo-se sobre uma população
de selvagens indígenas.

Claudete Maria Miranda Dias. Mestrado em História do Brasil. Universidade Federal do Piauí. E-mail:
clau@ufpi.br

Nenhum comentário: